Um Domingo Qualquer
Ergues as tuas mãos aos céus e perguntas porquê.
Chovem fagulhas assassinas empurradas por vento que não escolhe... apenas semeia destruição.
Gritas-lhe com o ar dos teus pulmões. Berras por água. Que saiam de casa enquanto podem. Vestidos de desespero e impotência.
Cheira a fumo e a morte. E não para de chover.
Molhas as paredes, árvores, o pelo aos animais. Alguém se lembra de os ir soltar... e não regressa.
Com um pouco de sorte teus vizinhos vencem o pânico e ficam, ali, lutando contra a chuva que não pára. Gritam por ajuda... mas ninguém vem. Ninguem pode vir. Simplesmente são demasiados gritos, demasiadas casas, demasiadas almas... e tão pouco caminho.
Estás entregue a ti mesmo e aos teus demónios que bailam na chuva de chamas.
Deus não chove aqui.
Nem o politico que quis o teu voto, e muito menos o causador da chama primeira.
E ou desistes e foges, ou continuas a combater a chuva com a água que te sai da torneira. Há até quem despeje tinas de vinho nas chamas. O mesmo vinho de "Tomai e bebei todos. Este é o meu sangue derramado por vós". Triste ironia.
O vento traz, o vento leva. A desgraça segue viagem.
Aos poucos, tu e os outros companheiros de fornalha, vão vencendo as chamas, o laranja cede ao castanho acinzentado.... e o fumo... o fumo teima em lembrar-nos que ainda não acabou.
Contam-se as casas que se perderam... vidas plasmadas no cimento, o carro, o pinhal, a vinha... a vida.
Já passaste por isto. Uma e outra... e tantas outras vezes, que desistes de acreditar que alguma vez será diferente.
Já nem ligas a TV para ouvir o discurso dos entendidos ou as desculpas dos políticos. Não vale a pena, nem sequer o tempo gasto. Nada mudará.
Sim... já não chovia desde Abril... felizmente começa a cair...
Ouves dizer: -"Graças a Deus!", e não consegues conter o sorriso...
-"Esperem pelas chuvadas. Peçam a Deus que limpe esgotos, não desvie caudais de águas nem deixe construir em zonas de risco."
Pois... não me parece.
Um sincero agradecimento a todos os Bombeiros, Forcas de Segurança e Pessoal Médico. Por vezes esquecemo-nos que também têm casa, família, haveres... e sangram. Como todos nós. Foram tremendos!
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