Amanhã Talvez
Tropecei recentemente num texto tão belo quanto sofrido. Um daqueles que não consegues ficar indiferente, que não podes deixar ficar ali... sózinho, na sombra... esquecido.
Não.
Este é um daqueles textos que se tivesse um nome todo xpto a servir de montra, andaria por aí, de perfil em perfil. Mas não é... A autora é apenas uma pessoa como tu e eu... gente que acorda sem saber como vai correr o dia, que sangra, grita, ri e geme. De prazer ou de dor. Gente que vive na sombra... mas GENTE!
Perguntei se podia partilhar... foi-me dito que sim, mas preferencialmente anónimo. Respeito isso. Aliás... sei bem o que é isso de nos protegermos atrás de um pseudónimo ou perfil protector.
Mas das minhas palavras já estão vocês fartos, é tempo de ceder o palco para ti, Anónima Simplesmente M.
Obrigado.
"Amanhã talvez
Quero-te encontrar daqui a um ano. Daqui a dois, daqui a três. Daqui a dez, quando estiver mais próxima de ti e compreender que nem tudo, fica onde deve ficar. Ontem queria muito encontrar-te hoje, há uma semana queria-me esbarrar contigo numa cidade que não fosse a minha nem a tua, há um mês queria ver-te amanhã, há um ano queria-te encontrar, mesmo sem saber quem eras ou como andavas. Mesmo sem saber todo o veneno não tóxico que consegues trazer por detrás de um sorriso, de um abraço, ou das palavras que usas que não deviam ser ditas. Eras tu que via no teto do meu quarto quando ouvia conversas sem piada, quando vivia noites sem principio ou fim, ou quando me tentava "reapaixonar" por alguém, que já tinha perdido em mim há muito tempo. És tão bonito à tua maneira, que não sei se mais alguém te vê assim sem ser eu. Eu nunca te vi como as pessoas te pintam em mesas de café, em conversas informais ou em dias sem nada para contar. Vejo um coração podre, numa alma pura. Foi por isso que fiquei agarrada a ti, mesmo que nunca te o tenha dito. És quase tão puro como eu, quase tão podre como nós. Ele era diferente de todos os homens que eu já tinha conhecido. Então eu sempre pensei, que amanhã talvez. Amanhã talvez nos cruzássemos numa rua, recebesse um telefonema ou ele me batesse à porta sem razão nem motivo às tantas da manhã. E tantos revirar de olhos e "não obrigado" disse eu, na esperança que talvez fosse aquela a noite, em que ele faria de conta que tínhamos mesmo nascido um para o outro. Talvez um dia, ele me encontrasse de costas a escrever, num concerto sem sentido ou num bar com música diferente da que costumamos ouvir. Talvez um dia ele se decida. Era o que pensava para mim todos os dias, quando a imagem dele e voz , se tornavam cada vez mais distantes do mundo em que vivia. Vejo em ti alguém que anda por andar, que sorri raramente quando ninguém está por perto, e que luta contra todas as vozes que lhe ecoam dentro do corpo. E amor, eu sei que raramente te ouves a ti mesmo. Por mais confuso que possa parecer. Aprendi a gostar de ti no amanhã, e isso tornou-se tóxico. Fartei-me de falar, como se me estivesses a ouvir. Todas as características que nenhuma amiga minha procura, todos os defeitos que a minha mãe me diz ao almoço para me afastar, o que sempre quis enquanto crescia, tudo junto torna-se em ti. Pouco equilibrado, pouco normal, pouco de promessas, pouco de "amanhãs", muito de ti próprio. Hoje, não te quero ver amanhã, nem ontem, e se pudesse voltar um ano atrás, não teria feito para tropeçar em ti. Teria-me deixado ficar no sítio em que estava, com quem estava, e a passar Domingos em família e sem vinho no frigorífico. Mesmo que isso vá contra quem sou, e mesmo que ninguém compreenda aquilo que digo quando escrevo para ti, por mais confuso que sejas e por mais instável que aparentes ser, tu foste sempre a diferença que procurei em todas as caras que já vi. Talvez tu sejas o certo no meio disto tudo. Ninguém dito normal troca estabilidade, por gritos no nada. Eu não sou normal, já sei. Mas nunca encontrei piada em nada que fosse banal. Não deixei que mais ninguém ficasse ao meu lado na cama, mesmo quando nunca ficaste. Afinal, de que servem os "talvez" e os "amanhãs" que nós mulheres pintamos nas nossas cabeças eternamente apaixonadas? Eu respondo-te. De nada. Quem gosta fica, fala, liga, aparece no nada, e o "talvez" aparece só em situações ocasionais. Não há homens indecisos, há homens cobardes. Quem promete futuros em folhas soltas, ou promete mundos e fundos em eternidades, ou não sabe já o que é o amor, ou perdeu o gosto de viver. Amanhã já cá não estamos. E quem passa os dias com medo de arriscar, nunca viveu. Escolho não ser a mulher que espera por "amanhãs" , assente em "pode ser", gravada com "talvez" na testa e sempre com o teu nome na ponta da língua. Não sei porque te defendo, porque te quero, ou porque te vejo depois de me esquecer de ti. Foste sempre, a parte mais irracional em mim. Então de uma vez por todas, deixo-te ir de dentro de mim, da mesma maneira que te deixei ficar. Sem noção de quem és, sem saber onde andas, nem a quem sorris. Deixo-te ir porque já não aguento, nem suporto, o peso que é carregar-te em mim todos os dias. Não te posso mostrar caminho nenhum, quando ainda não te encontraste. Vou viver e sorrir da mesma maneira que o fiz até a vida me fazer tropeçar no teu jeito diferente de ser, sem medo de viver, de me magoar ou de sorrir a quem não conheço. Talvez um dia, a vida nos faça mesmo esbarrar nos braços um do outro. Até esse dia, sê feliz à tua maneira, no teu mundo, e nas tuas coisas.
Quando te encontrares, encontra-me a mim.
Se ainda estiver perdida."
Se ainda estiver perdida."
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