Os Tempos do Alentejo
Viajas na estrada, na família e na alma.
Conheces pedaços de um Todo que nunca tinhas cruzado. Abres o peito de espanto, reduzido à tua insignificância física e temporal. Tu és pouco mais que NADA, apenas uma mera partícula em viagem pelo o que te rodeia.
Sais do sistema venoso tradicional em busca de algo que te surpreenda. Encontras aquilo que já estava lá antes de chegares... impávido e sereno. Nem acusa a tua presença, assim como não notará quando partires. Não deixarás nada que perdure.
Mas tu levas. Tu trazes contigo o que entrou pelos olhos, o calor das águas, o seu gosto salgado, a carícia do sol… a calma reinante em tudo o que te rodeia.
No mercado local dizem-te que estamos no Alentejo, que tudo se faz no tempo próprio. E é verdade. O Tempo não parece viajar no Alentejo. Não o vês mover com a mesma velocidade que teu ritmo cardíaco exige. Não quer saber do teu tempo.
Não.
Até a Geologia to grita… tu és bem menos que o Mar. Esse mesmo que diariamente embate contra as rochas e recua… para voltar uma e outra vez, enquanto existir falésia para vencer. A ilusão do horizonte plano faz-te pensar que é fácil comer quilómetros… que as distâncias ganham-se apenas correndo entre elas.
Puro engano.
Percebes agora que quanto mais obstáculos encontrares no caminho, mais fácil para ti se torna vencer a distância. É no movimento que tu te encontras, no ultrapassar da montanha, no abismo vencido, na sensação de poder que a velocidade te dá quando ultrapassas os obstáculos e pontos de referência ao longo do caminho.
Mas no Alentejo… no Alentejo tu esperas até que o horizonte venha até ti… Ou então desces ao nível do Mar e testemunhas a batalha entre os elementos, tentando cronometrar o rumo dos acontecimentos, rotulando as marés ou a resistência da rocha. Mas tu és pouco mais que nada… apenas estás ali, num pedaço do Tempo, em plena Viagem… Não é o teu mundo e muito menos a tua Casa.
É fácil perdermo-nos no Alentejo. Não na estrada, mas na mente. Demasiado espaço para vaguear solto e sem direcção, com um sol castigador para quem ousar fazer sombra que se mova mais rápido que o astro. O Alentejo tem o seu Tempo próprio, com os elementos do seu lado, o que torna a vida muito difícil para quem lá (sobre)vive, quem tem lá a sua Casa.
Fazes a Penitência do Regresso, de alma lavada e salgada, com a pele curada e os olhos cheios de tudo do que não conseguiste ver, apesar dos quilómetros que comeste. Tens a certeza que te adaptarias tão perto do Mar, que deixaste muito por descobrir… mas esta não é a tua Casa. Podemos viver em muitos locais diferentes, mas Casa… aquela espécie de útero onde te sentes seguro, só tens uma. A menos que andes perdido desde o berço.
Que nunca nos falte Casa.
Até porque os abrigos são... temporários.
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